Letras



1. Era de Aquário


No meu aquário morre um peixe por dia
E meu olhar habita na água parada
Eu não sei se é lágrima ou água salgada
Mas, no meu rosto, uma gota, eu sei que escorria

Ela não sabe de nada
E se nadasse não seria na minha
Ou eu morro na praia
Ou num balde de água fria

Refrão
Ela não sabe de nada
E se nadasse não seria na minha
Ou eu morro na praia
Ou num balde de água fria

Cilada é morrer nas suas mãozinhas
Nas linhas que eu não sei onde vão dar
Nem se eu fosse um grande advinha
Tivesse lido a bíblia, o alcorão ou o torá

Refrão
Ela não sabe de nada
E se nadasse não seria na minha
Ou eu morro na praia
Ou num balde de água fria

Ela vem me abrindo os poros
Decifra-me ou te devoro
Arrepiando minhas escamas
Ela com seu peso
Eu com meus gramas

Eu sou um peixe pequeno
Se eu fosse um cavalo marinho
Não faria diferença
O meu mar é tão razinho
E no aquário ela não pensa


2. Soldado Colorido

Se eu virasse um soldado rosa
Disparava doces num canhão
Bateria continência pro arco-íris
Trocaria o tanque por balão

Se eu virasse um soldado colorido
Fujiria sem nenhum tostão
Buscaria a minha Dulcinéia
Trocaria as medalhas por paixão

Mas é só
Um sonho
É imaginação

Boi da cara preta
Monstro do armario
Matinta pereira
Bicho papão

Mas é só
É só
Imaginação

Teia de ranha
Fantasma de lençol
Sombras na parede
E escuridão

Mas é só
É só
É imaginação!


3. Gregor Samsa


Onde andará você
Daqui a pouco eu já sei que vou procurar
Entre os musgos ou no centro de lírio
Nos meus cabelos entre os pêlos dos meus cílios
Não vá se atrasar
Desatenta no jardim
Nós temos um encontro com pó de pirlinpimpim
Nossos milhares de pés não podem tropeçar
Joaninhas espalham bolinhas pelo ar
Confetes e serpentinas
Insetos engraçados me emprestam suas asas
Mas só você é quem
Sabe voar


4. Amarelasse


Se a luz amarelasse assim tão brilhada
É dia da sua mudança
Farei café pra você se acordar
Ficar tão perto como um céu distante
Fomos duas pessoas numa só
Feijão com arroz
Fomos o yin e yang
Teimar
Tentar pensar que tudo um dia vai mudar
Temer o tempo não nos leva a nada


5. A viola e o pandeiro


Pegue o seu pandeiro
Que eu pego a minha viola
Eu sei que eu sou estrangeiro
Mas eu quero sambar na escola

Não sei
Sambar o teu samba não sei
Não sei malandragem
Não sei
E os sapatos brancos perdi
Na última esquina
Num bar
Mas minha viola eu salvei
E com sete notas fugi
Pra com teu pandeiro casar

Pegue o seu pandeiro
Que eu pego a minha viola
Eu sei que eu sou estrangeiro
Mas eu quero sambar na escola


6. A boca


Quando as pedras rolarem
Em minha cabeça
Assim que fechares a boca

Escorregarei no teu veneno
E sentirás
O meu amor (2x na 2ºparte)

Nos pequenos detalhes
Sinto teu cheiro
Calada, despercebida
Embalam-me por enquanto teus encantos


7.Sessão Vintage


Baby, vamos assistir a um filminho velho
Ver uma película de romance velho

Intenso branco e preto
Você dissesse sim
Se você dissesse sim

Eu diria aceito



Baby, a sua boina vermelho vivo

O meu suspensório vermelho vinho



Num filme branco e preto

Você me diga sim

Se disser que sim

Que eu lhe digo aceito



Aas rosas vermelhas estão murchando

Sua mãos de unhas longas vermelhas murchando



Que filme branco e preto

Você dissesse sim

Se você dissesse sim

Eu diria aceito



Os meus olhos estão secando vermelhos

O seu batom desbotando borrado vermelho



O nosso filme branco e preto

Deveria ter dito sim

Se você dissesse sim

E eu diria aceito



Agora, um pouco antes do filme ir queimando

Ele todo se consumindo pelo vermelho



Sobrou meu coração em branco e preto

Você disse-me não

E não, eu não aceito



8. Vinhetas



8.1 Canção para amigo imaginário n°01



Eu

Não posso ficar com você

Porque você não tem braço

Então, não vai poder

Carregar

Meu violão de aço



8.2 Miss Disco Voador



Ô abre ala, la, la, ô

A mulata foi eleita miss disco voador



8.3 Charango



Yo non hablo español

Para decirte que te amo

Yo non hablo español

Yo non hablo español

Pero toco charango



8.4 Soda



Soda

Só da você

Só da pra me perder

Soda limonada

Soda limonada



Soda de limão

Dim dão, dim dão

Soda limonada



9. Despertador 7:45



Se um dia você quebrar seus espelhos

Quem sabe você vai ver

Uma janela se abrir

Numa noite vai querer dormir

No chão

Mudar de ângulo

E de visão



Eu sei que você ainda vai

Esquecer de ligar o despertador

Eu vou ficar aqui te escutando por que no meu relógio

Nunca é tarde demais



10. Aceno



Hey, quem sabe um dia a gente

Se acerte, nem que seja num aceno

Intuitivamente aceite

Um clima mais ameno



Por enquanto

Para tanto tempo aguado

Eu nado para uma miragem

Uma ilha em alto mar pacificado

Uma longa, longa história sem personagem



Ai, alma

Ao mar

Ai, alma

Ólha lá

Olha eu

Mais um homem ao mar



11. Porta-jóias



Não tenho um porta-jóias

Que guarde as coisas que me dizes

Mas no pianinho que tocas

Giro inocentemente

Na borda das suas notas



12. Por que me miras se no me quieres



Andando assim

Tão perto

O que poderia fazer

Se não buscar-te

Com a porra do olhar

E abrasar-me

Novamente

Na simetria das nossas

Desventruras

Se nos aproximássemos

Aproximássemos



O mais perto que um beijo

Seria tão pouco

Me inflamas feito fogo de um sol



Que não pararia nunca (nunca pararia)

Não pararia nunca (nunca pararia)

Me inflamas feito o fogo de um sol



13. Van Gogh



Uma bailarina me abraçou pelas costas

Seu vestido tigrado e o meu coração em postas



De madrugada eu releio os mesmos romances

De madrugada eu releio os mesmos romances



Numa tenda árabe, eu a como num banquete esfumaçante

Aquela pele pintada de vermelho misturada com fogo

Misturada com sangue



Parece um Van Gogh ao sol das cinco da tarde

Parece um Van Gogh ao sol das cinco da tarde



14. Eu não sou clichê



A mente humana mente

È um espelho desigual

O que a satisfaz é convincente

O que não lhe convém

Lhe faz mal

O que não lhe convém

Certamente lhe faz mal

E é assim

Que eu vejo você



A minha impaciência

Com você me investigando

O branco da minha gola

Ah, esse branco me engasgando

Ou nos meus enormes bolsos

Um refugio profundo

Eu não sou clichê e aliás

Nos seus pequenos mundos ninguém é

Nem mesmo você



Abotoado

Em seu sutiã

Daqui parece ser quase sempre manhã

Habituado aos seus

Particulares

Já gastei muito tempo, já cansei minhas tardes



15. Cabine 103



Mamãe, me tira daqui

Que eu não estou ficando louco

Fique aqui mais um pouco

E eu lhe digo que eu já nasci assim (nasci pra fora de mim)



Quero poder não dormir

A minha insônia de volta

Todas as noites em claro

E as idéias brotando cá dentro de mim



Se quebro tudo em volta

Isso é que se chama feeling

Mas os remédios me deixam tão fraco

Que eu não consigo fugir



Mamãe, me tira daqui

Eu nasci fora de mim



Mamãe, me tira daqui

Eu nasci fora de mim





17. Discos do Odair



Você esteve ausente por um longo tempo

Trouxe saudades na mala e eu lamento,

Mas vai partir com seu fusca barulhento

Pra longe de mim



Daqui pra frente há de ser assim

Eu já quebrei nossos discos do Odair

E os cacos deles pra dentro varri

Pra dentro de mim



(Gentilmente roubado do bregueiro Roberto Vilar):

Eu não sei

Se você

Foi pro Irã e morreu na guerra

Ou será que você se esconde mim?



Nos nossos discos do Odair



18. Varal de Carnaval



Pensou que eu fosse me enforcar com o encordamento do seu violão

Pensou que eu fosse me enforcar com o encordamento do seu violão



Mas não faz mal

Eu usei o encordamento pra esticar um varal

E pra esquecer o quanto eu sofro

Estendi a fantasia pra tirar o mofo



Ah, um dia

Eu vou preparar uma afronta

O encordamento enferrujado

E a fantasia pronta



Então, verás

O meu rosto num cartaz

Convidando para um baile de carnaval



Então, verás

O meu rosto num cartaz

E a sua lembrança triste num varal





19. Piquenique no Espaço



Hoje, eu vou passear

E matar a fome

Vou numa nave lunar

Fazer um piquenique



Com a galera do mal

Sentar e encher a pança

De lanche espacial

Broca alienígena



Com minha capa (eu pareço voar)

Fazendo pose (com a bermuda toda molhada)

Então, sai da frente (eu sou clart kent)

Tanta comida (fez meu buxo espocar)

Nao esperava te encontrar por lá

Porque não vem brincar?



20. Valsa do Vento



Eu vou a vários lugares

E sinto o vento

Eu vejo muito

Mas não contento

Eu jogo o vento aos ares



21. Valsa da Lua



A lua saiu para lhe ver

És parte dela sem saber

Tu és um brilho intenso

Que sempre saiu quando voltei

Deixas-me um rastro de um luz

Que sempre me conduz a retornar

Me deixas repousar na tua nuvem furta-cor

Pra que eu possa adormecer

E espera o brilho teu

Só assim saberei

Se por mim vais retornar

E depois partir com um pedaço meu



22. Danças circulares



Vai girar, girar

no inicio e no fim, então será

redonda, uma rodinha circular

e ao chegar ao fim vai começar

tudo de novo assim que iniciar

ciranda, cirandinha, cirandá

no bosque uma maçã vai encontrar

madura, vermilhinha, circular

e o céu girando



no fundo pupila orbicular

arrodeando o céu vai encontrar

dois sóis a sucederem-se no ar

a noite e o dia a se casar

um vulto sobre a água navegar

e entre o inico e o fim fará uma ponte

na linha do horizonte circular

e o céu girando



23. Formigas



Formigas

Que trabalham noite e dia

Lavem todas as louças que eu largo

Sobre a pia



Vaga-lumes

Iluminem minha cria

Eu estou escrevendo a dez meses

Uma poesia



Ela cansou da boemia

Me deixou um café

Agora, eu choro o leite derramado

Que coalhou



Eu sou a louça sobre a pia

Abandonado enquanto escrevia

Hoje, ofereço este poeminha

De amor



24. Ainda sem nome



Já não sei mais

Quanto tempo

Eu vou demorar pra entender qual é

É a onda

Desse mundo

Retorno eterno

Eterno partir



Em pedaços

Pés descalços

Vão me trair

Com certeza

Põe na mesa

O que se tem no coração



25. Francesa 1



26. Francesa 2





27. Ainda sem nome



- Sabe onde fica o mar?

- Não. Desconheço o lugar.

- Então, eu preciso ir.



- Sabe, acho que eu vou nessa.

- Mas porque tanta pressa

Se ainda é dia?



- Eu não sei cartografia

Pode chover e não tenho capa.



- Eu te empresto um guarda-chuva

E desenho-lhe um mapa.



28. sem nome



O que te sustenta é absurdo

branco e longo véu em ascenção

abaixo do gelo desnudo

derreta queimando na minha mão



Minha verticalidade que é negada

em tempestades se dissolveria

é mistério em plena luz do dia

tua concepção mal engasgada



29. Bergamota



eu vou te fazer

um doce de bergamota

com frutas maduras

um doce em compota



eu vou te dizer

você não sabe o que gosta

dos gomos da tangerina

eu vou te dar uma prova



porque o tempo não leva

o sabor desses dias

a nostalgia em conserva

o sabor desses dias

três potes de tangerina